Subia as ruas escuras madrugada
adentro com medo. A cidade pacata, guardando o sono dos habitantes, refletia a
luz da lua no calçamento de pedras pontiagudas. Tudo seria aconchegante se
estivesse deitada, que fosse em um colchão de palha, a mirar o teto de telhas
de barro. Mas, agora, depois de tudo, sentiria medo em qualquer rua, em
qualquer lugar. Um velho bêbado apontou um pouco antes, “ali pra cima da rua
dos prazeres”. Aquilo soou irônico. Ela era a própria ironia. De dia, seria
percebida. Agora, só os gatos fazem alguma mesura.
O pé de mamão poderia ser um
cipreste de cemitério, tão absorvido pela noite negra. Tudo trazia a nota de
algo fúnebre. Ela, sua cabeça pesada. Relances, fatos, memórias, filme. Tudo
tremia como um graveto. Tudo confundia como a água pisada. Medo. Medo e passos.
Ali, era uma casa onde se forjava ouro. Os buracos na altura da rua davam para
calabouços, porões onde se depositavam gente e excretas. De noite, como se
fosse esta mesma noite, todos os cheiros traziam o ar para baixo.
O salto se intimidava pelas
calçadas. Um para-peito fingia a presença de alguma pessoa. A sacada mesma
parecia espiar. Noite do sem-fim, caminho nenhum. Sentou ali mesmo em uma
sarjeta – meio-fio, como dizem por ali. Na testa, o cabelo de festa grudado. Na
cabeça, memória de festa nenhuma. De repente, luz tímida; nascia o dia. Rosa,
fúcsia, negro véu que agora se invertia em azulado.
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