quarta-feira, 14 de março de 2012

do sol

Sempre foi assim. Pão e circo. Bom, menos pão e mais circo, porque o cachorro-quente era seco, ruim e custava 12 pila.
E é circo. Apesar de toda a tecnologia, é circo, sim, com tenda, números clássicos do malabarismo e contorcionismo, mágico, palhaço, ou o mágico-palhaço com sua assistente gordiiinha, querendo atenção dos holofotes – ne me quitte pas...
Eu aqui, meio reticente, pé-atrás-de-mineiro, pensando ser tudo como coisa pra turista, sabe como é, fui meio que cabrito-amarrado lá pros brejos do Park Shopping, lugar que evito de ir, pela confusão que é estacionar, destemperos que Brasília traz de sobra pros meus momentinhos de laser. Anyway. Preocupada com o pequeno peludo que ficara em casa adoentado, com sua imagenzinha miúda e debilitada a apontar na minha cabeça toda hora como uma estorinha contada em slides. Era natural o desconforto, também passando frio na porta da tenda, esperando o resto da companhia chegar.
É coisa pra turista, não paro de pensar. Quando mais se perceba que eles vendem até a mãe, desde que possua a logo do Cirque du Soleil, com seus direitos registrados.
Tá bom, sento-me. Não gosto muito duns ajudantezinhos que começam a se mostrar o próprio espetáculo, fazendo umas gracinhas com pipoca, com as senhorinhas tentando se sentar. Aff...
Mas o show começa com seres molusquentos, coró-de-coco se rastejando pelo chão. E mais e mais um. Elementos que começam a te confundir, figuras que saem do meio de uma floresta de tubos de metal, e, de muitos que são, você começa a não conseguir acompanhar. O chão mesmo é um cenário, com buracos que engolem e devolvem os personagens.
O jocker, tenho certeza de que é francês, com seus músculos finos e salteados como os de um alpinista, começa a contar a estória, e logo se vê que tem apelo ecológico. Transforma barulho de carro, buzina, em passarinho, vagalume. E as luzes se apagam de uma vez e é um vagalume que realmente apresenta a atração.
Um anjo-pássaro, frágil como uma pena, cai do céu e tem suas asas roubadas e é enrolado por uma rede, que sobe pro menino fazer tanta façanha, tanta pirueta e pendurações e contorcionismos, que você não acredita mesmo. É o ponto mais alto da noite – e faltam letras aqui pra descrever.
A música é ao vivo, com uma japinha miúda e bonitinha cantando com vozes e mãos, e também um cara mais pro grave, maior, meio gordo. E cantam palavras inventadas com vogais bem faladas e “erres” e “esses” e tem uma banda atrás totalmente sincronizada com tudo o que acontece no palco, finalizações, saltos, suspense de quem está “quase” caindo... tudo isso.
E tem tanta referência, tanta coisa que reconhecemos sem sabermos de onde vem, tudo num consciente coletivo, subconsciente, uma coisa meio Tarantino misturada, séculos, milênios, acumulados de encantamentos que tocam os olhos e os sentidos de alguma criança em Tupaciguara nos anos 60, do Tonho da Lua, ou da velhinha de classe média bem perfumada pra noite.
Homens que gritam e dançam graves como russos, crianças malabares, meninas de borracha, mágica de mentira, o outro que faz malabarismo com bolas dentro da boca (... até agora não acreditei... rsss), um deficiente físico de muletas, que recria o estigma da perfeição do corpo que a própria imagem do circo carrega, emociona pela habilidade e deixa uma mensagem ao instigar o anjo caído a se erguer, tudo realmente vale a fama que o circo carrega, impossibilidades acontecendo a pouco metros torneadas pelo jogo de luz, pela emoção do aplauso e mais umas coisas que a gente não sabe o que é.
É de turista, é de turista mesmo. Mas é arte, é música, é expressão corporal, é sensação, é sentimento. É arte, e arte sempre vale a pena.

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