quarta-feira, 21 de março de 2012

- “Pronto, aconteceu de novo...”
- “Sentimentos num caçador de andróides?”
- “Não, melancolia na menina da bicicleta...”
É. Ela foi chegando de mansinho. Ela é pequenininha, mas poderosa, de costinhas frágeis, me espreitando pelos muros molhados de chuva, onde passo a mão. A encontro em um sonho, segurando um ramo de alecrim. Se parece comigo, parece que olho num espelho. Mas é um pouco diferente, o cabelo mais cansado. Cheia de estórias, fala muito, mas quando me olha, me olha profundo, sabendo o que eu to pensando, e estou pensando que ela sabe o que eu estou pensando.
Ali, agora, olhei pra ela, falei até meio ríspida, nem me arrependi, mandei ela embora. Mas ela é insistente... Veio com a chuva e parece que ela não vai se despedir enquanto o chão não secar.
De noite, assisto novela, e ela acha que o que ela tá me fazendo é companhia. Mas sei, hoje eu sei, tudo isso é um vampirismo. De que adianta a profundidade, se o que a gente quer é só que alguém vá à padaria por você? Bom, sabe, ela é até inteligente, quer dizer, ela é, profunda, interessante, mas ninguém a penetra. Fazia francês – pelo menos isso ela deixou de bom pra mim - , fez alemão.
Aliás, vou dizer bem o que eu acho, agradeço muito, a olho em todas as fotografias, os dentes meio tingidos, sinto pena dela, sinto raiva, mas agradeço a ela tudo o que sou hoje, tudo o que pude me tornar, a pele quente que carrego, a falta de pelo que convida todos os sentidos, hoje, sou muito mais pele, mais morena, mais mulher. Tá bom, não desdenho mesmo, não cuspo, obrigada, obrigada, mas, agora, termine o seu café e vá embora, senão você vai perder o ônibus.

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